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Jornal do Concelho de Oleiros | Francisco Carrega | Periodicidade: Trimestral | Novembro 2024 nº92 Ano XXIII
António Lobo Antunes apresenta novo livro
Regressar a Angola com a Comissão das Lágrimas

António Lobo Antunes - Foto de Pedro Loureiro.JPG

António Lobo Antunes é um dos grandes escritores de língua portuguesa de sempre e uma das vozes sonantes na literatura mundial. Autor de 31 livros, - o primeiro livro Memória de Elefante foi publicado em 1979 - conta mais de 30 anos de carreira literária. Tem 69 anos e já venceu todos os prémios literários que um escritor pode ganhar, menos o "Gordo", como ele mesmo chama ao Prémio Nobel. A propósito dos prémios que conquistou, desvaloriza com humor: "pareço um cavalo», para depois acrescentar «o dinheiro dá jeito".

À questão se faz falta uma vida inteira para aprender a escrever é com uma citação de Hipócrates, não fosse António Lobo Antunes também médico - que responde: "não chega. Estou sempre a aprender a escrever. 'A arte é longa, a vida é breve, a experiência enganadora' e a gente nunca aprende".

António Lobo Antunes falava ao Oleiros Magazine, após apresentar o mais recente livro, Comissão das Lágrimas, edição D.Quixote. O autor do Tratado das Paixões da Alma, Manual dos Inquisidores, e O Meu Nome é Legião esteve no auditório da Biblioteca Municipal, da cidade de Castelo Branco, no dia 4 de Novembro, numa iniciativa conjunta da Câmara Municipal de Castelo Branco, da Editora D. Quixote/ Leya e da Livraria Amar`Arte.

Comissão das Lágrimas é um retorno a África. Sobre o momento de partida para o livro diz: "não recordo bem como é que aquela voz começou a falar e levou-me para Angola. Não sei. Se perguntar a uma pereira porque dá peras, ela não é capaz de explicar. Era aquilo que tinha de ser escrito, independentemente da minha vontade".

Comissão das Lágrimas vai buscar o título ao tribunal onde passaram os suspeitos de envolvimento no Golpe de Estado de Maio de 1977, em Angola. O Golpe foi liderado por Nito Alves, dissidente do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA). A obra fala da coragem de uma mulher, Elvira, a quem chamavam Virinha. A comandante do batalhão feminino do MPLA que foi presa, torturada e morta na sequência da alegada tentativa de golpe de estado em Angola. Ao ser torturada ela nunca deixou de cantar.

E o escritor também sofre com o sofrimento dos seus personagens?

"Claro que se sofre. É uma mistura de sentimentos. Mas não há um sentimento sem o seu contrário. Não há sofrimento sem alegria; não há violência sem suavidade; não há secura sem ternura. Os sentimentos são muito complexos, contraditórios e simultâneos", explica ao Ensino Magazine.

As guerras, o Salazarismo, a guerra colonial vivida na primeira pessoa, levam-no a denominar como perigosos os Substantivos Abstractos. "Substantivos Abstractos como a Honra, a Pátria…os políticos amam a Humanidade, mas não amam os homens", diz.

O pai do escritor defendia "a coragem, a verdade, e o rigor" como valores fundamentais do carácter humano.

A conversa prossegue. Um bom livro, tal como os homens, também tem de ter valores?, questionámos.

-"Não só. Mas, tem de haver um sentido ético da escrita, senão não se sente", esclarece, enquanto explica que está "sempre a negociar os livros com a morte". Por isso, diz que só se sente bem a escrever e sofre de sentimento de culpa se não o faz.

António Lobo Antunes, ainda não começou o próximo livro. Mas, para marcarmos encontro na Comissão das Lágrimas, ou na obra que se seguirá, é preciso saber se o livro é um lugar de encontro entre o autor e o leitor. Para António Lobo Antunes deve ser, isso sim, "Um lugar de procura"...

Eugénia Sousa
eugenia@rvj.pt
Pedro Loureiro