Rui Pedro Braz, comentador da TVI, com raízes no concelho
As voltas da bola no mundo do futebol
O pontapé de saída do mais disputado
campeonato de futebol das últimas décadas acontece a 14 de agosto.
Rui Pedro Braz, jornalista com raízes no concelho de Oleiros,
analisa as possibilidades dos três grandes e perspetiva uma das
ligas mais ansiadas dos últimos anos. Aqui fica um excerto da
extensa entrevista concedida ao Ensino Magazine, outra publicação
do grupo RVJ Editores.
O programa «Mais
Transferências», que é transmitido na TVI 24, às 12h30, 18h30 e
22h30, lidera as audiências no cabo, revelando-se um sucesso. A
notícia da transferência de Maxi Pereira para o FC Porto foi
anunciada em exclusivo. Como funciona o processo de recolher e
filtrar a informação para trazer a antena?
O convite para fazer este programa
foi lançado pelo diretor de informação da TVI, Sérgio Figueiredo, e
pelo Joaquim Sousa Martins, editor de desporto da TVI, que teve a
ideia do «Mais Transferências». O facto de a escolha ter recaído em
mim e no Pedro Sousa teve como principal vetor o facto de
conseguirmos conciliar a vertente de comentador e jornalista -
embora nenhum de nós seja, neste momento, jornalista temos a
facilidade de chegar, com rigor, a fontes importantes. A partir do
momento em que existem essas duas características o essencial foi
definir um rumo para o programa.
(...)
Devem chegar muitas
mensagens de fontes mais ou menos interessadas nas transferências.
Como é que se despista a informação contaminada e
especulativa?
A partir do momento em que
começamos a ter um programa com tanta audiência, é neste momento
(em julho), diariamente, o programa mais visto do cabo, faz com que
nos comece a chegar muita informação, proveniente dos mais diversos
quadrantes. E o nosso trabalho passa por avaliar a consistência e a
fiabilidade da informação. Posso dizer que existiram muitas
contratações que nos garantiram que se iriam confirmar, originárias
de fontes seguríssimas e através do cruzamento de informação e da
análise da realidade face aos valores envolvidos chegamos à
conclusão que não devíamos avançar. O tempo acabou por dar-nos
razão, porque mais tarde soube-se que essas transferências não
correspondiam à verdade. Essa filtragem faz-se com capacidade de
análise do mercado e, sobretudo, com muito bom senso. E confiança
nas nossas fontes, claro está.
A irracionalidade é própria
do futebol e dos seus adeptos. Como reage aos insultos e às ameaças
que lhe têm sido dirigidos, nomeadamente através das redes
sociais?
As redes sociais são uma espécie de
metáfora da vida real. Há de tudo. Bem intencionados, mal
intencionados. O que não podemos é ceder à ditadura das redes
sociais. No dia em que isso acontecer o jornalismo, a isenção e o
comentário estão condenados. Porque o que se pretende impor, neste
momento, perante o jornalista, o comentador e a figura pública é
uma ditadura de pressão, protagonizada por pessoas que muitas vezes
não têm nada para fazer na sua vida. Bem sei que a taxa de
desemprego é elevadíssima e a falta de formação ainda é grande, mas
normalmente são essas pessoas que optam por tecer esses ataques nas
redes sociais. O ataque à figura pública passou a ser um hóbi para
muitos desses desocupados. É preciso combater essa lógica. Nós não
podemos, de maneira nenhuma, trabalhar em função do que é escrito
nas redes sociais e da cólera de muitos que descarregam em nós as
frustrações do dia a dia.
Sente-se, mesmo que
indiretamente, condicionado?
No dia em que me sentir
condicionado, o jornalismo estará morto e a figura pública
condenada. O grande problema destas pessoas que proliferam nas
redes sociais é que pensam que só por saberem o nosso nome e
conhecerem o nosso rosto já nos conhecem enquanto pessoas. Isso não
é verdade, de maneira nenhuma. A figura pública, por detrás do seu
trabalho, tem uma vida, tem família, tem valores, que não podem ser
invadidos por este tipo de "terrorismo". Lamento que algumas
pessoas, apesar de estarem cada vez mais informadas nos dias que
correm, ainda teimam em não fazer o uso correto da informação,
limitando-se a agredir quem se expõe.
O defeso futebolístico está
a ser fervilhante, nomeadamente com as transferências de Jorge
Jesus e Maxi Pereira. Perspetiva-se o mais animado campeonato das
últimas épocas?
Acredito que sim. A expectativa é
elevadíssima. Os adeptos estão ansiosos. Para começar, a mudança de
Jesus do Benfica para o Sporting ajudou a apimentar o arranque dos
trabalhos, seguindo-se a também surpreendente transferência de Maxi
Pereira do Benfica para o FC Porto. Para além disso, há nomes
sonantes que têm chegado, em especial, para Porto e Sporting. Nos
leões, Bryan Ruiz e Teofilo Gutierrez, nos dragões, Iker Casillas,
Maxi Pereira, Imbula, etc. São todos jogadores talentosos que veem
acrescentar qualidade ao futebol português. Para já a grande
incógnita é saber como é que o Benfica vai reagir a esta nova
estratégia de investimento dos seus dois maiores rivais. Até ver os
encarnados são aqueles que precisam de mexer menos. São bicampeões
em título e no dia em que gravamos esta entrevista (21 de julho),
perderam apenas Maxi Pereira. Podem perder Gaitán e têm Salvio
lesionado para alguns meses, o que faz admitir que o plantel
necessita de alguns retoques. E depois é preciso saber como é que o
Benfica vai reagir à saída de Jesus, após 6 anos na liderança do
banco encarnado.
Iker Casillas é a
contratação mais mediática de sempre do futebol
português?
Sim. Este campeonato tem todos os
ingredientes para gerar grande mediatismo. E a contratação de
Casillas, com um palmarés impressionante, vai dar grande
visibilidade no exterior à nossa liga. Estou em crer que a
expectativa que está a ser criada vai ter reflexos na
competitividade e na disputa de cada jornada.
Vai, finalmente, ser uma
luta a três, como antecipou Jesus?
Vamos ver. Muitas vezes diz-se que
o campeonato, neste século, nunca foi disputado a três. Não é
verdade. Recordo em 2007/2008, com Fernando Santos no Benfica,
Jesualdo Ferreira no FC Porto e Paulo Bento, no Sporting, o
campeonato terminou com dois pontos de diferença entre o campeão
(FC Porto) e o terceiro (Benfica). Esse campeonato foi competitivo,
mas nivelado por baixo e o que os adeptos anseiam é assistir a uma
liga nivelada por cima.
(...)
José Mourinho visou as
contratações, a seu ver milionárias, para o contexto
sócio-económico português, de Sporting e FC Porto. Quem é que o
treinador do Chelsea procurou atingir?
Não sei se Mourinho visou Porto ou
Sporting, creio antes que procurou beliscar Casillas e Jesus, duas
figuras com quem tem mantido um "quid pro quo". Mas há que referir
o seguinte, há uma diferença grande entre gastar e investir. Os
clubes portugueses não estão a gastar por gastar, estão a investir
com a expectativa de obter um retorno desportivo e financeiro. Mas
é claro que os clubes nacionais investem acima das suas
possibilidades e realidades concretas, com a particularidade de no
caso de Benfica e FC Porto esses investimentos serem sustentados
nos ganhos. O FC Porto é dos melhores clubes do mundo a valorizar
jogadores para posteriormente vendê-los e o Benfica, fruto de uma
estratégia de gestão muito sólida e eficaz, tem tido rendimentos na
casa dos 200 milhões de euros por ano de faturação, um valor sem
precedentes no contexto português. Isto é resultado de algumas boas
vendas de ativos, estratégias de marketing fantásticas e do próprio
desempenho do canal do clube, a BTV, que permitiu triplicar os
ganhos com os direitos televisivos.
(...)
A bolha do futebol
português corre o risco de rebentar?
Creio que já houve mais risco do
que existe agora. As pessoas têm memória curta e esquecem-se do
estado em que estavam os clubes portugueses na transição para este
século, com estruturas desfasadas da realidade, estádios obsoletos,
um amadorismo tremendo nas práticas de gestão, etc. Esse cenário já
não existe. Os clubes estão muito mais profissionais, obviamente
que este progresso teve um custo, foi preciso investir e despender
importantes verbas para reformular todo o parque desportivo
nacional. Para já, Benfica e Porto são os que apresentam melhores
resultados na forma como exploram o novo contexto, mas acredito que
o Sporting caminha a passos largos para o conseguir, da mesma forma
que acho que o futebol português tem capacidade para ultrapassar a
crise.
Qual é a probabilidade de
algum clube português ser comprado por um milionário russo ou
árabe?
O clube mais exposto a uma situação
dessa natureza é o Sporting, devido ao facto de os angolanos da
Holdimo já terem uma participação muito forte no clube de
Alvalade.
O novo patrocinador do
Benfica é a transportadora área Fly Emirates. Isso poderá querer
indiciar algo?
É diferente. Benfica e Porto têm
ambos SGPS (Sociedades Gestoras de Participações Sociais) o que
impede que qualquer acionista tenha mais ações da SAD do que o
clube, inviabilizando que o clube caia em mãos alheias. Uma coisa é
certa, qualquer clube que não apresentar resultados desportivos
fica mais exposto aos ataques do mercado.
(...)
Nuno Dias
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