Crónica
Os novos rurais
A agricultura está de
volta. Depois do abandono dos campos agrícolas, levando à
desertificação dos solos e ao despovoamento dos territórios, com as
consequentes assimetrias regionais, tão nefastas e evidentes para
todos, parece que a sociedade começa a perceber finalmente que o
futuro passa pela agricultura e pelo mundo rural.
O abandono dos campos agrícolas,
com sérias implicações na produção nacional, levou à perda de
posição estratégica de muitas das nossas fileiras produtivas.
Deixámos de tirar partido dos recursos endógenos e ficámos cada vez
mais dependentes do exterior, com todas as desvantagens que já
todos reconhecem.
É urgente uma nova visão
territorial que pense o rural e o urbano de uma forma sustentável,
sempre com duas perspetivas que se complementam e que não podem
viver uma sem a outra: a perspetiva local e a perspetiva
global.
Os chamados "novos rurais" podem
ser a solução para este problema, povoando os territórios e
valorizando-os, na medida em que lhes conferem massa crítica, assim
como uma maior atratividade e competitividade. São pessoas que
normalmente têm uma cultura de território assente em ideias
inovadoras e sustentadas, numa visão de longo prazo que reconhece a
importância da agricultura para o seu país e para o seu legado.
Esta classe de novos povoadores
embora tenha vivido na cidade, opta por viver no mundo rural,
assumindo-se geralmente como amantes do campo. Tendem a aproveitar
o melhor de ambos os mundos e levam algum do conforto que têm na
cidade para o campo.
Vivemos, cada vez mais, numa aldeia
global. Os "novos rurais" associam-se normalmente a jovens
empreendedores que criam riqueza e trabalho, assim como valor
acrescentado aos produtos gerados nos territórios rurais. O
conceito "glocal" - agir local, pensar global - começa assim a
ganhar mais força com produtos made in espaço rural que são depois
amplamente comercializados.
Estas pessoas que importa atrair e
fixar nos territórios de baixa densidade, promovem um regresso
sustentável à ruralidade, estimulando o desenvolvimento económico
de muitos locais que se encontram atualmente envelhecidos e
deprimidos, restaurando os afetos e restabelecendo laços, assim
como um sem número de outros benefícios para as populações
rurais.
Por outro lado, é urgente reduzir
as alarmantes assimetrias regionais que se verificam atualmente.
Segundo dados da ONU, em 2015, prevê-se que cerca de 70% da
população portuguesa esteja a viver nas áreas metropolitanas de
Lisboa e Porto, com toda a perda de posicionamento do Interior. Não
faz sentido que um país que deveria ser encarado como o litoral
europeu, cujo território continental tem uma extensão máxima, em
largura, de 218 Km, verifique tão acentuadas disparidades.
A vinda dos "novos rurais" para o
chamado "Interior" só poderá trazer vantagens, minimizando muitos
dos problemas económicos, de mobilidade, de segurança, sociais e
ambientais que se verificam ao nível nacional.
Por outro lado, os novos
povoadores, para além de uma maior proximidade ao mercado espanhol
(na maior parte dos casos), podem tirar partido de uma melhor
qualidade de vida e recuperar algum tempo de lazer extra,
valorizando muito do património edificado que se encontra ao
abandono, abrindo as mentalidades dos locais onde residem e
aproveitando uma panóplia de oportunidades que aí se encontram por
explorar.
O empreendedorismo em meio rural é
assim encarado como a solução de muitos dos problemas estruturais
que se verificam na atualidade, através da promoção de fileiras das
mais variadas áreas, suportadas pelas tecnologias de informação e
comunicação e as quais tiram partido dos recursos endógenos
existentes.
Nesse sentido, a agricultura passa
a ser novamente encarada como setor estratégico, numa altura em que
é consensual que Portugal tem de reduzir a sua dependência externa,
por exemplo, através de iniciativas agrícolas orientadas para as
novas tendências de consumo.
O futuro deverá passar então por
uma maior aposta no mundo rural, equilibrando as condições de
investimento existentes por todo o território. Fomentar o
desenvolvimento do chamado "Interior" deverá ser encarado como uma
prioridade e um desígnio nacional, concedendo benefícios a quem
nele acredita.
Inês Martins
(Engenheira Agrónoma)