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Jornal do Concelho de Oleiros | Francisco Carrega | Periodicidade: Trimestral | Novembro 2024 nº92 Ano XXIII
José Cid, em entrevista
A televisão não mostra a verdadeira música portuguesa

19821387861126080947533383507243606678618.JPGAos 73 anos, José Cid regressa aos tempos de «menino prodígio» com um álbum onde recupera uma faceta mais rock. O músico português descreve o novo disco como um trabalho "rebelde e politicamente incorrecto". José Cid vai estar em Oleiros dia 5 de agosto, no primeiro dia da Feira do Pinhal. O espetáculo começa às 23H30.

«Menino Prodígio» é o cartão de visita do trabalho discográfico com o mesmo título. Como tem sido recebido?

Acho que da melhor maneira. O videoclip do «Menino Prodígio» está com cerca de 50 mil visualizações no YouTube. O disco em si tem sido igualmente bem recebido. É muito bom ver a resposta do público nos concertos. Ao vivo, as pessoas cantam comigo em coro.

A canção «Menino Prodígio» é um trabalho autobiográfico. Como é regressar à infância?

Vivia na Chamusca, no Ribatejo, e os amigos do meu pai ficavam muito admirados por eu, com quatro ou cinco aninhos, cantar e tocar piano. Ninguém estava à espera, uma vez que ninguém me ensinara. Então chamavam-me menino prodígio. Entretanto, como diz a letra da canção: o "menino prodígio morreu, mas o seu epitáfio sou eu".

Este álbum reúne vários temas censurados, na altura em que fazia parte do Quarteto 1111. Qual é a sensação de compor uma música e ela ser censurada?

Nós, e um grupo restrito de cantores da altura, tínhamos grandes dificuldades com a censura. Tínhamos a censura em cima de nós, feroz, muitas vezes injusta, outras vezes agressiva. E nós enfrentámos a censura. Eu tenho 28 canções proibidas no antigo regime, dava para preencher um álbum duplo. As canções continuam atuais. Para este novo álbum fui buscar três canções ao meu passado e dei-lhes uma roupagem atual: «Blá! Blá! Blá!», «Monstros sagrados» e «Rock Rural».

Acredito que seja agradável recuperar esses temas.

Sim, e são completamente actuais. O meu álbum é autobiográfico em dois temas só: «Menino Prodígio» e «O andar de Marylin», que foi a minha primeira grande paixão, com 12 ou 13 anitos. Quando morreu estava já apaixonado por aquela que foi talvez a mais bonita mulher do cinema. É, de resto, um álbum de consciência e politicamente incorrecto, daí a sua rebeldia e o seu interesse.

No alinhamento do disco há um tema de Aerosmith. Porquê uma cover da banda de Steven Tyler?

A história começa para aí há 15 anos atrás, quando o tema saiu. Fui cantar ao Casino Estoril e, nessa ocasião, cantei também alguns temas que não era meus. «I Don't Want to Miss a Thing» foi um deles. Depois, já em 2005, fui escrever o meu livro de poesia a uma ilha das Caraíbas onde à noite fazia karaoke num hotel em que ninguém me conhecia. Cantei a canção dos Aerosmith e fiz muito sucesso (risos). Comecei a ir todas as noites cantar este tema no karaoke. O ano passado a RFM convidou-me para um programa ao vivo e cantei «I Don't Want to Miss a Thing». A reação do público foi extraordinária e eu resolvi incluir o tema no meu álbum. É quase uma provocação, para se perceber que eu consigo cantar outras coisas.

Tem muitos cuidados com a voz?

Tenho. Não bebo álcool, não fumo nem bebo coisas geladas. Tenho também cuidado com as alergias.

Tem de estar em forma para os concertos deste verão...

Até setembro vou ter 40 concertos em Portugal. O público quer ouvir-me. O meu concerto é extraordinariamente procurado no país inteiro, porque atravessa várias gerações. É um concerto com muita música e pouca conversa. Toco as canções que toda a gente conhece e algumas novas, acompanhado por músicos muito bons.

Com a edição deste disco promete conquistar mais público, sobretudo nas camadas etárias mais jovens.

Já tinha esse público. Mas este ano toquei em quatro queimas universitárias. É muito bom ver os jovens cantar todas as minhas canções.

José Cid é uma grande referência da música portuguesa. Qual é a leitura que faz do panorama atual?

Vejo muitos projetos jovens que têm imensa dificuldade em se impor, particularmente os que cantam em português. E, depois, vejo com muito desagrado programas de televisão, aos sábados e domingos à tarde, que nivelam a música pelo nível mais baixo. A televisão não mostra a verdadeira música portuguesa. Há muitos jovens com qualidade que não aparecem ali, porque esteticamente não são o que os programas procuram.

Hugo Rafael
Texto: Tiago Carvalho
Direitos Reservados